Acompanhava o detetive no caso, dentro do táxi Sherlock me contou tudo que dizia ele já ter contado, antes que eu levasse a estranha pancada na cabeça, mas acompanha-lo tinha se tornado diferente, não que fosse estranho, já o fizera inúmeras vezes, diria até que era uma sensação nada mais que rotineira. O que diferenciava esse caso dos outros não era o fato de nosso inimigo ser o mais frio e rápido no ataque, o que tornava diferente era o fato de Sherlock Holmes estar diferente, como eu posso dizer...
“ele estava muito próximo.”
–Você tem certeza de que está bem? Seu rosto está vermelho, pode ser que ainda sinta alguma dor. – Perguntava o detetive, inquieto.
–Sim Sherlock, eu estou perfeitamente bem. – Tentava ser o mais breve possível, tê-lo tão perto fazia aquela estranha sensação retornar, alem do que, ainda me encontrava desnorteado pelo fato de quase ter sido pego cheirando a cueca do meu melhor amigo, dá para acreditar? Cheirar a cueca de Sherlock Holmes, muitas garotas fariam qualquer coisa para ter uma chance dessas. Não era apenas “cheirando”, era algo mais, eu gostava da sensação, gostava do cheiro, gostava do calor que aquilo me causava. Não saberia explicar, mas creio que era algo que beirava a admiração, só podia ser, se não me conhecesse, diria ser interesse, mas não poderia EU estar interessado em Sherlock Holmes, então levaria este ato como “uma atração através da grande admiração”. Era melhor.
O detetive estava inquieto, movia as mãos e cruzava os dedos com certa frequência, mesmo dentro de um pequeno táxi não ficava parado, seu cabelo estava uma bagunça, mas por mais estranho e eu diria que nervoso que estivesse, sua postura permanecia impecável.
*Lembranças de John*
Numa noite de verão, algumas semanas após meu casamento, estava eu, sentado de frente a minha lareira, lia um romance qualquer, sem muito interesse, queria apenas descansar, pois tivera um dia exaustivo de trabalho. Mary já estava em nosso quarto e pelo silêncio que residia a casa, diria que ela já tinha adormecido. Fitava aquelas chamas e pensava no tempo em que não via meu amigo, talvez estivesse num novo caso e por isso não tive noticias suas. A imagem do detetive andando de um lado a outro no 221 B tomava minha mente, usava seu terno impecável e talvez tocasse seu violino, ou talvez estivesse deitado no sofá, completamente concentrado e perdido em seu palácio mental.
Ouvi de repente o toque da campainha.
Olhei o relógio. Faltava dez minutos para meia noite. Não podia ser uma visita a tal hora da noite. Imaginei que fosse novamente Srtª Gloria, nossa vizinha que constantemente vinha me pedir ajuda a essa hora.
Fui até a entrada e abri a porta, para meu espanto, dei de cara com Sherlock Holmes.
–Se esperava a sua vizinha, que a tratar pelo modo que se vestia e por estar usando maquiagem a essa hora, a qual estava tentando te seduzir, mandei que voltasse e apagasse as velas, pois o Srº Watson esta noite estaria ocupado tomando um chá com seu amigo. Fiz certo em manda-la voltar? – Me lançou um pequeno sorriso.
–Perfeitamente. – Dei um curto sorriso e convidei-o a entrar.
–Você sabia que ela iria lhe servir porco? Você odeia porco..- Falou com certa satisfação. – Bem, podes me hospedar por esta noite?
–Claro! Seria um prazer tê-lo aqui, mas, me sinto tentado a perguntar o por que disso.
–Ora! Preciso de algum motivo para querer passar a noite na presença de um amigo? – Perguntou, enquanto sentava na poltrona ao lado da minha.
–Não tente me enganar, você mesmo disse que Sherlock Holmes não tinha amigos.
–Meu caro John, isso ainda o afeta? – Ele sorri – O motivo é simples, o Mycroft queria que eu pegasse o caso de um dos seus “superiores” e por isso, esta noite, está em Baker Street, esperando que eu volte, o que não vai acontecer.
–E por que ele mesmo não resolve o caso? Ele tem uma inteligência e rapidez incrível.
Sherlock me lança um olhar nada contente.
–Mycroft deve estar ocupado evitando uma guerra em algum lugar não muito interessante, sendo assim, podemos parar de falar dele.
*Voltando a realidade*
–Mycroft....- Sussurrei.
Não sei por que numa hora como essas eu me pegava pensando no irmão do detetive, mas, não me parecia fazer sentido pensar nele na situação em que estamos então... por que?
Sherlock se aproxima, sinto seu ombro pressionando o meu, tenho certeza de que se virássemos ao mesmo tempo, acabaríamos nos beijando.
–Por que está pensando nele? – Ele estava apreensivo, não olhava para mim, apenas fitava a janela do taxi.
–Eu não sei...- Olho para baixo.
Precisa haver algum motivo, por que eu pensaria em Mycroft Holmes, por que? Tinha algo a ver com o caso? Mas do caso eu pouco sabia. Por que? Seu rosto estava colado em minha mente e alguma coisa parecia errada.
Sou retirado de meus pensamentos ao sentir algo frio entrando em contato com minha pele, vejo sua mão deslizar sobre meu pulso e encaixar na minha, prendendo seus dedos aos meus.
–O que você est...- Ele estava distante, o corpo estava ao meu lado, mas a mente viajava, mesmo eu não ousaria tentar descobrir.
Fitei seu rosto por algum tempo mas logo virei, e lá ficamos, cada um olhando para um lado mas numa conexão única.
“O que está acontecendo com ele? Por que ele está tão diferente?”
Me incomodava o fato dele estar tão diferente, eu já havia me acostumado com o detetive que não sentia nada e que ignorava quase tudo que eu fazia, eu sempre desejei que ele demonstrasse ter sentimentos em algumas situações, mas isso estava fora do normal, nunca o vi parecer tão “frágil” . Já não sei o que fazer, não sei como agir.
Descemos do carro e lá já estava Lestrade, todas aquelas luzes e faixas me davam dor de cabeça.
–O que temos aqui? – Perguntou Holmes.
–Bem, me parece ser o nosso homem, veja, sem nada novamente, apenas o corpo, sem roupas, sem digitais diferentes, nada. – Dizia o Anderson. Sherlock claro, fez o favor de ignorar a sua presença.
–John?- Perguntou.
Andei na direção do corpo e olhei tudo.
–Me parece que esse homem tentou lutar antes de ser morto, ou não, já que ele foi baleado, mas o que explica esses hematomas? – Levanto levemente a cabeça, mostrando os hematomas na nuca.
–Nada né? – Sherlock olhou para Anderson e deu uma risadinha. – Hmm..Deixe-me ver melhor.
Ele se aproximou e começou a ver os fatos que até então, pareciam ocultos para todos, até mesmo para mim.
–Esses hematomas não foram feitos agora, pode perceber que estão bem claros, indica que ele pode ter entrado em uma briga com alguém outro dia, mas antes que fosse atingido pelo homem que estava a sua frente, veio um outro por trás e bateu nele com algo muito duro, assim, desmaiando nosso homem. O que me deixa intrigado é o fato do nosso assassino ter cuidado dele, podemos ver que esse homem é um morador de rua e não preciso dizer o por que cheguei nessa conclusão, então a pergunta é por que ele cuidou dele, quando na verdade só queria matá-lo? – Sherlock parecia cada vez mais animado, ele andava de um lado ao outro. – Lestrade! Mande desligar essas sirenes, Agora! E vocês todos, calem a boca!
Lestrade o fez. As pessoas ainda cochichavam, o que parecia irritar o detetive cada vez mais.
–John! Está ouvindo isso? – Ele parecia já começar ignorar o que os outros diziam.
Depois que ele falou e eu realmente prestei atenção, comecei a ouvir umas batidas, eram baixas mas audíveis, parecia as batidas de um ...
–UM RELÓGIO!! – Gritou Sherlock. Todos pararam de falar e apenas observaram.
Ele se aproximou do Anderson e do bolso de seu jaleco pegou um bisturi e se aproximou do nosso homem e do modo incisivo fez um corte na barriga, pouco abaixo do umbigo e colocando a mão lá dentro ele retirou um relógio, que por sinal não funcionava e que indicava ser 22:35. Sherlock olhou para meu punho e viu que eram 22:34. Ele respirava rápido e se movia constantemente, faltavam poucos segundos para 22:35, e ele sabia disso.
22:35.
–Celular vai tocar. – Sussurrou o detetive.
O celular de Lestrade tocou e após alguns segundos ele nos olhou com aquele mesmo olhar.
–Outro corpo? – Perguntei.
–Sim, e com esse virá mais uma coisinha. – Falou Sherlock, balançando o relógio.
Fomos em direção ao próximo corpo, esse já estava do outro lado da cidade. No táxi Sherlock estava quieto. Ele estava pensando, explorando todas as opções que tinha, procurando o real motivo daquele relógio, que segundo ele, não tinha só a finalidade de nos apontar o horário da próxima morte, pois, já saberíamos dela com ou sem relógio.
Nossa próxima vitima era agora uma mulher, loira, olhos claros e pele branca, seu corpo também nu, estava limpo com exceção de sua mão e boca, a mão estava melada de um liquido preto que parecia ser tinta, e em sua boca tinha um sorriso mal desenhando com o que parecia ser o mesmo liquido que marcava sua mão. Sherlock examinou todo o corpo e decidiu que dessa vez a mensagem seria externa pois não notara nenhuma anomalia no corpo da jovem, depois de alguns minutos olhando e olhando ele empurra o corpo, e notamos que nas costas da mulher está escrito algo.
“Lost”
–Lost?- Perguntamos todos de uma vez.
–Com certeza é uma mensagem e tem a ver com a Mary, note as feições dessa mulher, não lhe lembra alguém,John?
Agora que ele falou, eu me dei conta, aquela jovem de um jeito ou de outro parecia com a Mary, os cabelos curtos e loiros, os olhos claros.
– Haverá um terceiro corpo. A ultima pista.
–O que? – Perguntou Lestrade. – Mais um?
–Sim, todo criminoso que gosta de jogos tem de a deixar 3 pistas, cada uma está relacionada com a outra, sabendo disso, ele está nos desafiando a encontra-lo ou talvez encontrar a Mary. – Ele me encara por alguns segundos. – Mas, ele está contando principalmente com o desespero do nosso caro Watson que teve a mulher sequestrada por ele, mas, para a nossa surpresa nosso homem não está desesperado, muito pelo contrário, está mais tranquilo que muitos aqui e isso facilita o entendimento do caso, então podemos dizer que temos um ponto a nosso favor. Lestrade ligue para seus policiais e pergunte se acharam mais um corpo.
Sherlock olhava tudo, o percurso que a bala fizera e o tipo da arma que nosso assassino usara, ele sorria constantemente. Conhecendo-o eu diria que estava satisfeito com a inteligência e perspicácia do modo como o assassino realizava suas mortes. Arriscava em dizer que ele tinha voltado ao normal e que era aquele o Holmes que eu conhecia.
–JOHN!! – O ouvi Sherlock gritando e logo saltando para cima de mim, enquanto caiamos senti algo raspando na lateral de minha cabeça, quando estávamos no chão ele me olhava assustado. –Você está bem? – Perguntava.
–Estou, só acho que cortei um pouco minha cabeça. – Toquei no local do corte e vi que havia sangue em minha mão, mas pelo local onde cortou e pela gravidade do corte, poderia dizer que estava fora de perigo.
Sherlock se levantou, bateu seu sobretudo e logo me ajudou a levantar, ao olhar para o lugar onde a coisa que me atingirá parou, pude ver uma flecha.
–Uma flecha? – Perguntei.
–É um jeito bastante eficaz de matar alguém, mas, não é tão rápido e discreto como uma bala, por seu tamanho, fica “fácil” notar quando ela está vindo, acho que ele não queria realmente te matar, apenas assusta-lo um pouco. Me pergunto por que ele quer tanto te ver assustado. Mas, com esse ato, ele acaba nos mandar a terceira e última pista. – Sherlock se aproxima da flecha e retira um papel que estava preso ao cabo.
–Um mapa! – Exclama ele.
–De onde? – Pergunta um dos policiais.
–Precisamos voltar para Baker Street. Agora! – Ele pega minha mão e começa a me puxar, saímos da área do crime e logo pegamos um táxi.
Chegando ao 221B, ele disparou para dentro me arrastando.
–O que está havendo? O que você viu?. – Perguntei enquanto entravamos na sala.
Holmes pegou o relógio, uma foto das costas de mulher que ele tirara com seu telefone e o mapa que havia pego, colocou-os lado a lado na mesa e me chamou para que olhasse. “Venha sozinho Srº Watson”. Era o que havia escrito no canto do mapa, não era exatamente escrito, as palavras haviam sido coladas ali.
–Está vendo? O nosso homem colou as palavras, mas por estarem longe e desorganizadas, eu diria que ele estava com pressa, mas, já sabemos que conhecemos ele, pois, ao colar as palavras ele revela ser nosso conhecido.
–Se escrevesse nós poderíamos identificar a letra. – Murmurei.
–Exatamente. – Sherlock agora sentava na poltrona. – Se descobrirmos de onde ele tirou essas palavras, ficaria mais fácil decifrar este pequeno “enigma”.
Essa fonte não me era estranha, e não seria tão difícil, afinal meu nome não sairia em qualquer jornal por ai... realmente, essa fonte era..
–Meu blog. – Exclamei.
Num salto, Sherlock pegou meu computador e entrou em meu blog.
–Espere! Por que o meu computador? E como sabe minha senha? – Perguntei.
–Não é tão difícil. – Ele sorriu. – Tem muita coisa aqui Watson, preciso que você lembre em que caso usou essa fonte.
Fitei novamente as letras no mapa.
–O cão dos Baskervilles!- Recordei-me que usara aquela fonte, pois, achara o caso fantástico.
Depois de alguns segundos Sherlock fecha meu computador e deita no sofá. Nem preciso perguntar, sei que ele está em seu “palácio mental”. Passam- se alguns minutos e ele volta a si.
–É isso! Ele usou as palavras deste caso, por que ele quer caçar, ou melhor, ele quer que cacemos e nossa presa seria a Mary, isso explica o “lost” ele quis dizer que ela estava perdida e segundo nosso caso, ela deve estar em algum pântano... agora o relógio é o que me intriga.
Eu não discordaria, ele parecia ter completa certeza do que afirmava, e era Sherlock Holmes, o que eu temia era não ter tempo suficiente, e se ela morresse?
–Vamos Sherlock! Pense! Não sabemos quanto tempo temos.
–John! Você é um gênio. O relógio que contava a hora em que a próxima vitima iria aparecer, estava bem próximo da hora, por este ser um relógio digital, acredito que ELE nos mostrará a hora em que deveremos agir.
–Mas, ai diz que eu devo ir sozinho.
–Você quer mesmo ir sozinho? – Perguntou, agora ele olhava em meus olhos e vi um traço de preocupação em seu olhar.
–Que opção eu tenho? Não posso correr o risco de deixar a Mary morrer.
–Você sabe que pode não encontrá-la viva, não sabe? – Vi que ele evitara fazer essa pergunta, mas ela era necessária.
–Sei sim... –
Sentamos no sofá e ficamos esperando, Sherlock como sempre, estava pensando em algo e eu apenas pensava em salvar a Mary.
O relógio começou a tocar novamente. Indicava que eu tinha 30 minutos, o que era mais do que o suficiente, pois o local que indicava o mapa, não era tão distante dali, eu já saia quando Sherlock agarrou minha mão.
–Lhe desejo sorte na investigação e busca. Mas, não estou tranquilo com isso. –Disse ele.
–Com o que? – “Não é como se eu não soubesse.” Pensei.
–Com sua ida, John. É um caso perigoso, muito perigoso, e quanto mais vejo, menos gosto. É, John, você pode achar engraçado, mas ficarei contente quando você estiver a salvo, e novamente, aqui na Rua Baker.
Olhei para ele, e ele me lançou um sorriso, não era um sorriso simples e sincero como o de sempre, mas, dessa vez ele estava triste e eu percebi isso. Em outra ocasião eu ficaria com ele e diria que estava tudo bem, mas era a Mary quem estava em perigo, e eu não podia simplesmente ignorar esse fato. Não dessa vez.
–Eu ficarei bem.
Beijei sua testa. Ele ficou tão surpreso quanto eu. Meu coração acelerou e eu simplesmente bati a porta atrás de mim e desci as escadas.
“Por que eu o beijei?E por que o toque de sua pele me parece tão familiar?” .
Eu já estava no táxi, indo em direção ao que tudo indicava ser o paradeiro da Mary, mas, minha mente estava em outro lugar, em outra pessoa. Ela estava em Sherlock Holmes.
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