Estava escuro, um silêncio perturbador tomava conta do local, meus olhos começavam a se acostumar com a escuridão, mesmo sendo fraca eu consigo enxergar uma pequena luz.
“Mary!!”
Corro em direção a luz. Minhas pernas doem, os galhos arranham meu rosto, mas eu preciso encontra-la e levá-la de volta para casa. Para nossa casa.
“você pode achar engraçado, mas ficarei contente quando você estiver a salvo, e novamente, aqui na Rua Baker.”
A imagem do detetive cruza meus pensamentos, seu rosto meio sem graça, sua mão tocando a minha, meus lábios contra sua testa. Eu não conseguia tira-lo da minha cabeça, e pensar na Mary e na nossa casa, fazia eu me sentir tão “mal”.
Ao alcançar a luz, eu vi um corpo amarrado a uma cadeira, estava completamente coberto, só se via as cordas e os pequenos pés.
–Mary?- Sussurrei. Não podia correr o risco de ser percebido, caso tivesse outra pessoa por aqui.
O corpo começou a se mexer.
–Graças a deus! Fique quieta! Eu vou te tirar daí.
Fui me aproximando devagar e ao chegar nela, a desamarrei. Ela parecia bem, a mesma de quando a levaram, mas o que era estranho é que tudo tinha sido fácil demais, a parte do enigma foi um tanto complicada e se não fosse por Holmes eu não a teria encontrado, mas isso, isso tudo está muito fácil, é só resolver um enigma e ele a devolve assim? Sem nada?
–Vamos! Corra! – Peguei sua mão e já começava a correr.
–NÃO TÃO RÁPIDO – Gritou uma voz grave atrás de nós. – Achou que ia ser tão fácil?
Olhei em todas as direções mas não vi ninguém, a voz parecia tão perto, mas não havia nada nas redondezas, olhei para a Mary e pude ver um pequeno ponto vermelho em sua testa.
–Cuidado! – Gritei e a empurrei.
Agora o ponto estava em minha testa.
–Eu poderia te matar agora mesmo e matar sua mulherzinha logo depois, então do que adianta ficar na frente dela? Você está disposto a dar sua vida pela dela?
–Claro que sim.
–John,John, JOHN!! Você não está esquecendo de alguém? Você vai mesmo morrer e deixá-lo sozinho, por causa dela? – Provocou.
Foi nesse momento que me aconteceu algo muito estranho e inesperado, senti um toque em meus lábios, senti como se minhas mãos tocassem algo muito macio, senti um corpo me abraçar, mas não havia ninguém além de nós três lá. Novamente o rosto do detetive me vem a mente. Eu não queria deixá-lo, não estava pronto pra isso, não posso morrer agora, não posso deixá-lo sozinho.
Me vi incapacitado de morrer por minha mulher, começava a cogitar a possibilidade de deixá-la morrer para que Holmes não ficasse sozinho, o que está acontecendo comigo? O que eu devo fazer?
Minhas pernas fraquejam e caio de joelhos no chão enlameado, escuto a Mary me chamando, escuto a voz gargalhando, meus sentidos estão todos fraquejando, as vozes estão cada vez mais baixas, as coisas estão cada vez mais escuras, sua imagem ainda me toma a mente.
–JOHN!!!- Grita uma voz. É a voz dele.
–Sherlock? – Sussurro.
Tudo fica escuro, e não consigo mais sentir meu corpo, acho que vou...desmaiar.
*Lembranças perdidas*
Me encontrava na entrada do 221B, parecia tudo tão comum, mais um dia normal.
–Você não saberá se pode ou não, enquanto não tentar – Ouvi a voz de Sherlock que vinha lá de cima.
Com quem ele estaria conversando? Será que o Lestrade ou o Mycroft estavam lá?
– Faça isso em nome da ciência John! – Disse ele depois de uma pausa.
Como ele pode estar falando comigo se estou aqui? Sherlock Holmes poderia ter enlouquecido?
Subi as escadas correndo e abri a porta. Ao entrar na sala, notei que mesmo tendo eu aberto a porta, ela permanecia fechada, isso era muito estranho. Ao olhar para o outro canto da sala eu vi Sherlock Holmes me beijando.
–O QUE ESTÁ HAVENDO AQUI? – Gritei. Eles pareciam não me ouvir, e aquilo parecia tão normal, poderia eu estar morto e imaginando coisas? Não, não, por que eu imaginaria coisas com ele?
Vi o outro John levantar as mãos e acariciar os cabelos do detetive que já levava as mãos a cintura do menor o puxando para perto.
*Voltando a realidade*
–Eu lembro! – Gritei.
Mary estava sentada ao meu lado, deu um salto de susto.
–Você finalmente acordou! Do que você lembra? E por que seu rosto está tão vermelho?
Meu coração estava acelerado. A sensação de beijá-lo ainda se fazia presente e eu sentia descargas elétricas atravessarem todo meu corpo, meu desejo por ele só aumentava, eu tenho medo disso, mas eu não posso suportar.
–Eu preciso vê-lo. –Disparei da cama, peguei meu casaco e já saia.
–Pra onde você vai John? – Gritou ela da entrada do quarto.
–Para Baker Street – Sai.
Eu não estava com paciência para esperar um taxi, eu precisava vê-lo, eu queria vê-lo.
Correndo, cheguei em Baker Street em cinco minutos, subi as escadas ainda correndo. Abri a porta e lá estava ele, sentado em sua poltrona, olhava em meus olhos, ele fingia calma, como sempre, aquele rosto inexpressivo, mas eu o conhecia e sabia notar quando ele estava preocupado. Pelo menos era isso que eu queria.
–Não esperava vê-lo tão cedo, a julgar pelo modo em que está vestido e por sua forte respiração e por...
Não esperei que terminasse de falar, aquela não era uma boa hora para deduções, eu sabia o que queria, e eu sabia que tinha que fazê-lo, me sentia um animal selvagem.
Ele ainda estava sentado, quando abaixei minha cabeça e direcionei meu rosto na direção do seu. Nossos lábios se encontraram e eu tive aquela mesma sensação, seu toque já não era estranho, era mais que bom, era algo como... “necessário”... Suas mãos agora tocavam minha cintura, eu já acariciava seus cabelos. É como naquele dia. Só que dessa vez eu não voltaria atrás.
Ele me empurra.
–O que você está fazendo? – Perguntou ele.
–Não é obvio? – Retruquei, eu queria voltar a senti-lo, desconhecia aquele desejo absurdo, mas, já me encontrava perdido nele.
–Por que? O que aconteceu? E a Mary? – Ele arruma sua camisa, levanta e vai em direção a janela.
Ao ver sua expressão todo aquele desejo desaparece, só fica aquele sentimento impuro, eu fiz algo errado. Muito errado.
Ele sempre vai para a janela quando quer fugir de algo, essa é uma das poucas coisas que eu realmente percebi sobre ele, mesmo seus costumes sendo estranhos, esse é evidente, como também é evidente que dentre as besteiras que eu já fiz essa foi a maior delas.
–Você tem razão. O que eu tinha na cabeça afinal? – Queria sair dali, entrar em buraco e me enterrar lá dentro, estou tão envergonhado. – Desculpe por isso tudo, já estou de saída.
Eu ainda tinha esperanças que ele falasse alguma coisa, mesmo que fosse algo irritante como ele sempre faz, ou viesse atrás de mim.
–Até parece que ele faria algo desse tipo, ele é Sherlock Holmes, o homem que não sente nada. – Sorrio.
Continuo andando, não quero chegar em casa, estou com vergonha de olhar para Mary, o que eu fiz foi terrível, o que deu em mim? Eu sei que não foi culpa dele mas eu acho melhor não vê-lo mais, pelo menos até tudo voltar ao normal, eu sei que ele disse que precisava de minha ajuda para solucionar o caso mas não dá, tenho medo do que posso fazer, se ele não tivesse me parado até onde eu iria? Eu ia realmente trair a Mary? Se é que eu já não o fiz.
Meu celular vibra alertando uma nova mensagem.
“Você está bem?
S.H.”
Imediatamente chega outra.
“Sei que não, sou inteligente demais para perceber quando alguém está se sentindo um lixo.
S.H.”
Sorrio. Idiota.
“Você não está ajudando
J.W.”
Ele logo responde.
“Claro que estou. Você está até sorrindo.
S.H.”
Meu sorriso aumenta, eu me divirto com isso, mesmo a situação sendo péssima, mesmo tendo feito coisas horríveis, ele consegue fazer isso comigo, me fazer rir nas piores horas, ele é um idiota.
“Como você sabe disso?
J.W.”
Ele demora uns minutos e logo responde.
“Olhe para trás seu idiota.
S.H.”
Olho para trás e lá está ele, com seu sobretudo e cachecol, celular na mão e um mínimo sorriso. Corro em sua direção e o abraço.
–Me desculpe. – Sentir seu cheiro faz lágrimas começarem a escorrer pelo meu rosto, mas com as lágrimas também se vai o peso e a culpa. – Me desculpe, Sherlock.
–Eu já desculpei, desde a hora que eu resolvi vim atrás de você. – Ele me envolve com seus braços, carinhosamente.
–E por que veio?
–Na verdade foi algo bem estranho, eu só... – Ele para de falar e me solta. – É isso! John! Vá para casa e não saia de lá por motivo algum e tome muito cuidado. – Ele começa a correr em direção a Baker Street.
Corri para casa, eu não sabia o que estava acontecendo, mas algo me dizia que coisas não muito agradáveis estavam por vir, parecia que não íamos ter paz até esse homem ser pego, este caso é sem duvidas o mais complicado e perigoso que já tivemos e temo que vá perder alguém nele.
*Mais tarde naquela noite*
Está escuro, muito escuro, só vejo aquela pequena luz, onde estou? Esse lugar me parece familiar.
Arvores para todos os lados e o chão enlameado, um pequeno lago ao leste e aquela luz a frente.
“Estou no pântano...sim... no pântano onde encontrei a Mary”
Corri em direção a luz, os galhos que pegavam em meu rosto não me arranhavam mais, minhas pernas não doíam, então por que eu sentia uma dor tão grande? Por que eu sofria tanto?
Chegando a luz, vi dessa vez duas cadeiras com dois corpos, na frente deles estava Mycroft parado, ele me olhava com um sorriso no rosto, sem dizer nada foi em direção a primeira cadeira e descobriu o corpo, era a Mary, ela chorava e estava machucada, na segunda estava Sherlock, também machucado, mas, com o rosto inexpressivo como o de sempre.
–Chegou a hora de escolher John!
Dois pontos vermelhos apareceram, um na testa de Sherlock e outro na de Mary.
–Só um poderá sair daqui vivo. Quem você vai escolher? Meu tolo irmãozinho apaixonado ou sua bela esposa? Vamos John! Não deve ser tão difícil.
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